Pousa, era o lugar ou habitação onde o cobrador de foros reais devia pousar e receber mantimentos. Pousa é igual a pousada e modernamente a turismo. Vem do latim pausa, da expressão pausam facere ou pausam dare, significando dar agasalho ou dar descanso.
O verdadeiro nome da freguesia era: Santa Cristina de Ulgoso da Pousa. Ulgoso, terra de urze igual a urgueira, urzal, urzeira, urgal, que no português arcaico deu Algoso, adaptado a seguir, pelo povo.
Há alguns anos formou-se uma lenda, dando à palavra Algôs o mesmo sentido da de carrasco, no significado de executor de pena de morte. Para a maior parte da gente, a Pousa, teria dado um tal personagem, nada simpático e por isso a freguesia nunca daria sacerdotes à Igreja. Poderia haver seminaristas, mas nunca chegariam ao fim; mais cedo ou mais tarde ficariam pelo caminho, ou doentes ou até morreriam. O Povo, sabia que ter sido carrasco (algôs) era impedimento, ainda actualmente é, para receber ordens sacerdotais. De Algôs, personagem individual, facilmente se passou a acrescentar também a própria terra que teria tal castigo.
Para outros, eram menos os que assim pensavam, a palavra «Algôs» foi acrescentada a Santa Cristina da Pousa, por haver, perto da Falperra a freguesia de Santa Cristina de Longos. As duas freguesias seriam mais conhecidas pelo nome da padroeira, Santa Cristina, e para não haver confusão, quando se falasse da Pousa, dizia-se, S. Cristina de Algoso.
Pags. 19, 20 e 21, “Pousa S. Cristina – Reguela S. Salvador”, 1979, P. Hélio Gomes Ribeiro.
Nasceu em Tur da Toscana, situada sobre as margens do lago de Bolsena, povoação de que não resta o menor vestígio, por haver sido inteiramente submergida no próprio lago. Foi filha do governador daquela cidade, chamado Urbano, sequaz das superstições do paganismo, e portanto declarado inimigo do nome cristão. Aquele Deus que de tempos a tempos mostra à sua Igreja alguns prodígios do seu infinito poder escolheu uma menina de dez anos apenas, para que por ela triunfasse a fé no meio de uma família, porventura a mais obstinada nos desvarios da gentilidade.
O governador de Tur, furioso contra os cristãos, procurava-os com grande diligência e depois atormentava-os com bárbara crueldade. Eram poucas as horas em que se não viam a seus pés alguns destes generosos confessores da fé, e poucos os dias, que em seu tribunal se não fizesse algum interrogatório. A mesma sala do tribunal foi a escola onde a sua filha Cristina aprendeu as primeiras lições da nossa religião. Ao princípio perguntou por curiosidade que gente era aquela, que todos os dias comparecia perante o tribunal de seu pai, e na qual observava tanta compostura e tamanha ânsia de morrer no meio dos maiores suplícios.
Disseram-lhe que eram cristãos, os quais não adoravam mais do que um único Deus, votando os ídolos ao maior desprezo; e como eles depois da morte esperavam outra vida muito mais ditosa do que esta, faziam da presente tão pouco caso. Esta notícia que lhe deram acerca do Cristianismo, avivou-lhe a curiosidade. Assistiu frequentemente aos interrogatórios dos mártires; e como era este o meio de que a graça se servia, de tal modo se ilustrou que a breve trecho formou um conceito exacto da nossa religião, acompanhado de um ardente desejo do martírio.
A Providência facultou-lhe um meio de se instruir no cristianismo; algumas damas cristãs empregaram nisso os seus cuidados, e assim a foram dispondo para a felicidade de receber o baptismo. Tudo isto se fez muito em segredo; mas o zelo enchia-a de impaciência. Encontrando um dia os ídolos de seu pai que eram de ouro e prata, despedaçou-os e distribuiu estas preciosidades pelos pobres cristãos que se definhavam na miséria. Esta ousadia inflamou a cólera do governador. Esquecendo que era seu pai, determinou-se a fazer-1he expiar com o sangue este pretendido sacrilégio.
Havia já tempo que Urbano desconfiava de mudanças nos sentimentos da filha; agora não lhe restava dúvida alguma, depois do que ousara fazer. Mandou-a vir à sua presença, e temperando com aparências de doçura a cólera que o inflamava disse: «Eu não poderia acreditar, minha filha, que fosses capaz de cometer o crime de que és acusada; pois será possível que fosses tu a que temerariamente puseste mãos ímpias em nossos deuses? «Eis aí, responde a corajosa donzela, deuses bem divertidos, que se deixam despedaçar por uma jovem como eu. Pois será possível, querido pai, prossegue, que faleis seriamente, que deis o nome de deus a obras feitas a martelo e da mesma matéria que empregais em vossa baixela?» Urbano não a deixou prosseguir; transtornado e fora de si, esquecendo os sentimentos da natureza: «Eu bem vejo, lhe diz, que esses feiticeiros dos cristãos te transtornaram a cabeça; mas juro por Júpiter, que ou hás-de tomar juízo, ou hás-de perder a vida.» «Fazei, querido pai, lhe tornou a donzela sem se amedrontar, fazei tudo o que for da vossa vontade; podeis tirar-me a vida, o que não me tirareis, é a fé de Jesus Cristo, meu Salvador, que eu espero me dará forças para suportar os maiores suplícios.»
Este indigno pai, não podendo ser senhor de si, chamou pelos esbirros e receando que estes a poupassem, em sua mesma presença, mandou que lhe aplicassem uma tempestade de açoites. Mas, vendo Cristina tão serena como se nada se passasse com ela, quer que lhe rasguem as feridas com unhas de ferro, e que lhe despedacem todo o corpo até ao derradeiro alento.
Era um espectáculo horroroso ver esta inocente vítima, banhada no próprio sangue e de tal modo rasgada que se lhe viam os ossos; e não obstante, sem dar o mais leve sinal de sofrimento, erguia os alhos ao céu e rendia mil acções de graças ao Senhor por lhe haver proporcionado o desejo de por Ele ser atormentada. Depois, apanhando tranquilamente os pedaços da sua própria carne, dispersas aqui e além, parecia mostrá-los a seu pai como para o tocar. E de facto, Urbano, apesar do furor de que estava possuído, não pode suportar por muito tempo este horrível espectáculo; fingindo querer reservá-la para suplícios mais cruéis, mandou carregá-la de ferros e conduzi-la a uma horrível masmorra. As consolações celestiais de que foi cumulada, indemnizaram-na de tudo quanto acabava de sofrer, e inspiraram-lhe nova ânsia do martírio.
Este pai sem entranhas não podia compreender como sua filha pode sustentar-se por tanto tempo no meio de tão horríveis tormentos; pensava então que agora a sós na prisão reflectiria em sua deplorável situação; ainda mais afastada dos prestígios das cristãos feiticeiros, envolta nas trevas e no frio silêncio do cárcere, tudo isto, junto ao horror dos tormentos, pensava ele que actuaria na ânimo da filha. Para melhor ganhar o caso foram-lhe enviados os parentes que lhe pareceram mais próprios para a demover da sua obstinação.
Era porém a última ilusão. Sua fúria aumentou, quando soube que a filha persistia constante na confissão da religião cristã, sempre mais determinada a sofrer o martírio. Jurou então por todas os deuses: «Não se dirá, que uma rapariga de dez anos me impôs a lei, e que estes mágicos dos cristãos triunfam dos nossos deuses em minha própria família. Veremos se com todas os seus sortilégios podem sustentar-se contra novos tormentos, e, se a paciência de uma filha é capaz de esgotar a cólera de seu pai». Este tirano, mais cruel que as maiores feras, manda prender a hóstia inocente a uma roda molhada em azeite e debaixo da qual mandou acender uma fogueira, a fim de que, dando-lhe um movimento giratório, a filha fosse toda tostada. Era realmente um suplício extraordinário, mas a prodígio não foi menor, porque o Senhor fez com que a mártir não sofresse nada, ao passo que a chama activada par um poder invisível se abria aos lados para consumir muitas das pagãos, que tinham concorrida ao espectáculo.
O bárbaro e desnaturado progenitor, bem longe de se deixar impressionar por tantos prodígios, refinou em seus maus instintos, envergonhada de ter de ceder diante de um valor assim. Deu ordem pois para que a reconduzissem à mesma prisão. Deus por sua parte consolava a jovem visivelmente; não tardou que, ao chegar ao cárcere, um anjo mais resplandecente do que o sol, a viesse visitar, assegurando-lhe a protecção do céu, e curando-lhe todas as feridas.
Urbano, tenda ouvida a narração deste novo prodígio, enviou os carrascos com ordem de lhe prenderem ao pescoço uma pedra imensa, e de a precipitar assim na lago, para que mais se não falasse dela. A ordem foi executada; mas a promessa feita a Cristina cumpriu-se. O mesmo anjo, que a consolara, apareceu junta dela sobre as águas e conduziu-a à praia. Seu pai não pode resistir a este facto tão extraordinário. A raiva excitou-o tanto que no dia seguinte foram encontrá-lo morta em seu leito. A santa sentiu extremamente a triste sorte do seu infeliz pai muita mais do que seus próprios tormentos; persistiu na entanto em sua primeira resolução.
O governador Dion que sucedeu ao pai de Cristina excedeu, se é possível, a desumanidade do seu predecessor. Afagou desde logo o prazer de dobrar a firmeza da donzela; não querendo acreditar nas maravilhas que referiam a respeito dela, lisonjeava-se de a vencer. Mandou neste intuito preparar um berço de ferro, enchê-lo de azeite e pez fervente, e estender dentro dele a jovem. A coragem, com que Cristina entrou dentro desse tanque de fogo, assombrou os gentios. A sua confiança na omnipotência de Jesus Cristo não foi iludida, porque, tendo feito o sinal da cruz, achou-se como em um banho delicioso, o que a levou a dizer aos carrascos: «Fazeis bem em me meter num cesto de infante, porque também ainda não há mais de um ano que nasci pelo baptismo para a vida da alma». O governador considerou-se pessoalmente afrontado com esta espécie de desafio; deu pois ordem para que a levassem ao templo de Apolo, e a obrigassem a oferecer incenso ao ídolo. Todo o povo correu a ser testemunha deste sacrifício forçado; mas ao pôr a santa o pé no limiar do templo, o ídolo caiu no chão, e partiu-se. No mesmo instante o governador caiu repentinamente morto. Os carrascos aterrados largam a santa, e prostrados a seus pés, exclamam que não há outro Deus verdadeiro senão o Deus dos cristãos; e misturando as suas vozes com as demais de três mil pagãos pedem em altos brados o baptismo.
Um acontecimento tão prodigioso fez muito ruído. Deu-se a liberdade a Cristina; e até à chegada do novo governador novos soldados vieram alistar-se em cada dia debaixo do estandarte de Jesus Cristo. Juliano, assim se chamava o novo magistrado, foi bem depressa informado do que causava havia algum tempo o assombro e a admiração de toda a província. Nem por sombras hesitou em crer, como se cria vulgarmente, que todos esses milagres, atribuídos ao Deus de Cristina, eram meros efeitos de magia.
A morte repentina dos seus dois predecessores impressionou-o muito, mas este abalo foi logo combatido pela indignação que sentiu ao ver os deuses de Tur, e o próprio Apolo feitos em pedaços. Mandou pois vir Cristina à sua presença e disse-lhe: «É mister, ou sacrificar sem demora aos deuses, ou ser arrojada a uma fornalha ardente.» A santa respondeu em tom firme que não sacrificava senão ao verdadeiro Deus.
O governador deu a ordem de a arrojarem à fornalha ardente. Deixaram-na durante cinco dias no meio das chamas, que havia o cuidado de avivar, sem que por isso perdesse um só cabelo da cabeça, dando contínuas acções de graças ao Senhor, e entoando os seus louvores.
As actas desta insigne mártir contam que Juliano se dirigira a um mágico para lhe pedir conselho como haveria de acabar com a donzela cristã, e que este lhe persuadira que a metesse numa prisão com víboras, serpentes e escorpiões, assegurando-lhe que seria logo mordida. Mas todos estes animais respeitaram aquela, a quem as chamas nenhum mal tinham feito; e como não cessasse de cantar os louvores de Deus, o tirano cortou-lhe a língua. Perdeu-a por Jesus Cristo, sem perder o uso dela; prosseguia a cantar ainda mais alto estas belas palavras de David: «O nosso Deus está no céu, e de lá governa o universo com poder absoluto. Ao contrário os ídolos das nações não são senão ouro e prata, não passam de obras das mãos dos homens.» Este novo prodígio causou maior impressão ainda sobre os espíritos, do que os precedentes, corriam de toda a parte para serem testemunhas desta maravilha.
Envergonhado o tirano com o mau sucesso das suas invenções, e cansado de haver esgotado o reportório dos seus artifícios mandou ligar a santa a um poste e ali matá-la com flechas.
Foi neste suplício que Santa Cristina, sentindo um novo desejo de possuir a Deus no céu, por cuja glória combatia há tanto tempo sobre a terra, rogou ao senhor que lhe concedesse a suspirada coroa do martírio. Os seus votos foram ouvidos. Logo às primeiras setas atiradas entregou a Deus o seu bem-aventurado espírito, e foi receber no céu a digna recompensa, devida a tantos combates e tantas vitórias. Foi a 24 de Julho que teve lugar esta preciosa morte, e desde este dia foi honrada esta santa quase por todo o mundo cristão como uma das mais ilustres mártires da Igreja. Os cristãos sepultaram o seu corpo, que depois transportaram da Toscana para Palermo na Sicília.
Bibliografia: P.e Hélio Gomes Ribeiro, "Pousa Sta Cristina - Reguela S. Salvador", 1979.
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